sábado, março 29, 2008

Ainda o rescaldo do Ota-Fátima

Com a «nossa» Super-Clássica de Fátima em horizonte próximo – é já no dia 13 de Abril – ainda o Ota-Fátima-Ota do passado dia 21 não passou à história desta época. Os motivos para ainda animar algumas conversas de bastidores são mais que justificados, como a de hoje (sábado), em final de treino matinal na companhia do Capitão. Recordava ele que entre os 10 primeiros a completarem o percurso de 170 km estiveram (todos) os seis representantes do Pina Bike naquele evento – e que isso, com inteira justiça, reflecte bem o bom nível do nosso grupo.
Dessa verdadeira epopeia em Sexta-Feira Santa fica na retina o andamento verdadeiramente exigente até Rio Maior (28 km), onde a média registava mais de 34 km/h, com os topos da Espinheira e o carrossel que se segue a Alcoentre. O Nuno Garcia, nessa altura, definiu a acção de «altamente selectiva», tendo como objectivo separar, desde cedo, o «trigo do joio». Mas acabou por ir muito mais além...
A correria só abrandou quando, após Rio Maior, o pelotão deixou (finalmente!) sair os autores desse afogadilho. Homens da «casa», que, todavia, viram gorados os seus intentos devido a um furo por volta dos 45 km. A partir daí, o pelotão pôde finalmente descansar durante cerca de 20 km/h, em que se rolou em passo de... impasse, para assim voltar a reunir as tropas antes do ataque à subida para Fátima, por Minde e Covão do Coelho.
Foi uma subida demasiado intensa, pelo menos para o que esperava, considerando que culminou (apenas) na primeira metade do percurso, aos 85 km. Ao invés, foi abordada pelo grupo da frente como se a tirada terminasse aí, deixando-me com alguns receios sobre as consequências de tantas hostilidades no longo e exigente traçado que ainda faltava percorrer. Para mais, estando entre nós diversos elementos que se tinham juntado apenas em Rio Maior e aí ficariam no regresso. Ou seja, poupando 60 km em relação aos demais!
De qualquer maneira, os receios sobre os malefícios daquelas intensidades madrugadoras na minha condição física não se confirmaram e o regresso foi, sem sombra de dúvida, em grande estilo, cumprindo, o trio que chegou primeiro à Ota (eu, Freitas e César, da equipa de Salvaterra), uma média de 36 km/h nos referidos 85 km/h, para uma média final superior a 33 km/h. A vantagem sobre o próximo dos demais foi superior a 10 minutos.
Melhor do que isso só teria sido chegar isolado à Ota, mas foi objectivo impossível de atingir com tal concorrência. No primeiro topo da Espinheira e no último, na Abrigada, jogaram-se as derradeiras cartadas, mas o trio não se desfez. O César demonstrou enorme capacidade e, para mais, nunca houve a mínima esboço da minha parte e da do Freitas para qualquer jogo de equipa. Na minha opinião seria infrutífero. Pela minha parte, reconheço, que não havia forças para tentar escapar ao duo e depois de ter forçado o andamento ao máximo que podia na dura rampa da Espinheira, esfumaram-se todas as hipóteses de o conseguir. E o Freitas não o tentou sequer.
Em suma, foi uma óptima experiência, a repetir em 2009.

sexta-feira, março 21, 2008

Ota-Fátima-Ota: o prelúdio

Fantástica jornada de ciclismo entre a Ota e Fátima e regresso à Ota, na respeitosa distância de 170 km, percorrida, pelos primeiros, a não menos solene média de 33 km/h. Uma tirada verdadeiramente selectiva, praticamente a eliminar, num traçado parte-pernas, que juntou diversos «duros» das nossas estradas, entre federados bem rodados e empenhados praticantes. Nem uns nem outros tiveram supremacia – o que só fica bem!
Entre os Pina Bike, provou-se que alguns elementos estão em forma bastante apreciável. Destaco o Freitas, que comigo e o César (Salvaterra) integrou o trio que restou na frente na quarta parte final da tirada e nunca se desfez na longa cavalgada de volta à Ota, que chegou a ter momentos de boa intensidade, como na tão aguardada Espinheira.
Mais uma vez a equipa «cinza» deu boa conta do recado - Capitão, Nuno Garcia, Salvador, Freitas, Jony (serás sempre dos nossos!) e Ricardo. Rendo homenagem a todos os que participaram nesta louca aventura, pelo esforço, bravura e companheirismo. Em breve a crónica completa.

terça-feira, março 18, 2008

Santarém: a crónica

Ainda com a embalagem das planícies da Super-Clássica de Évora, este fim-de-semana correu-se mais «uma» candidata a igual estatuto. Isto se não o conquistou logo à primeira em que foi disputada à séria!...
Conta-quilómetros a tocar os 160 km – para os que cumpriram o percurso à risca - e desnível altimétrico acumulado que, sem sair do suave carrossel para roladores, chega para fazer corar de inveja a «Bela Alentejana» de há duas semanas.
As condições climatéricas para a prática do ciclismo foram óptimas: tempo seco, fresco e praticamente sem vento. À saída de Loures, pouco depois das oito da matina, o pelotão não era tão numeroso como o de Évora mas estava muito bem composto, a demonstrar que o aumento da exigência imposto por estas voltas grandes demove muito poucos. Pelo contrário, parece cativar cada vez mais participantes.
Agradável surpresa, as presenças do Rui (Scott) Torpes, já em plena forma – a ver pelas classificações cimeiras que vai obtendo no BTT - e do Runa, este ano ausente das competições federadas. Dois elementos cuja integração nos Pina Bike é sempre forte contributo para elevar o nível geral!
Primeiras pedaladas até Vialonga a uma média de 30 km/h, reduzindo, ao mínimo essencial, o habitual período de aquecimento, continuando a ritmo moderado até Vila Franca, onde a passagem pelo empedrado não atingiu os picos de loucura da tirada de Évora. De qualquer modo, os «culpados» do costume tornaram o andamento suficientemente rijo para desagregar o pelotão. Depois, também como é normal, relaxou-se após a ponte. E mais ainda quando o Evaristo furou, a meio do troço da recta do Cabo para Porto Alto.
Devido a este impasse, o pelotão dividiu-se entre os que pararam e os decidiram continuar... ainda que a marcar passo, permitindo que, sem grande esforço, o grupo voltasse a ficar compacto pouco depois de Benavente.
A partir daí, a «marcheta» foi sempre certa até Santarém, fixada confortavelmente acima dos 30 km/h, com cerca de meio pelotão a revezar-se na frente e outro em nítida gestão de esforço para a segunda metade do percurso. As reservas de alguns evidenciavam-se à medida que se aproximava a subida para Santarém. Todavia, aí nada se passou. Ninguém quis mostrar as garras e isso agradou sobremaneira aos que vinham temerosos. À chegada ao centro da cidade, os retardatários não eram muitos e não demoraram. Mesmo assim parou-se para um inédito cafezinho. O regresso seria, naturalmente, diferente.
Durante a neutralização, o Salvador dava sinais de impaciência, denunciando as suas intenções no reatamento da tirada: arriscar a fuga! Antes mesmo da subida de Vale de Santarém já se adiantara ao pelotão. Era a primeira fuga do dia! Pode parecer estranho, mas com essa iniciativa poupou muitas energias. E como? Desde logo, porque não teve que resistir ao andamento imposto durante a referida subida, «partindo» definitivamente o pelotão e seleccionando um sexteto na frente (eu, Freitas, Rui Scott, Runa, Evaristo e um companheiro, de Trek azul, que se estreava nas nossas voltas e que deixou muito boas indicações, que mais tarde referirei). O Freitas abriu as hostilidades quando o terreno inclinou, metendo o «tempo», mas rapidamente «abriu», deixando-me a dianteira, ao que não enjeitei, forçando bastante o ritmo até ao alto - pois já vinha com a ideia de o fazer.
Com isso, após a subida o Salvador não tardou a ficar à vista e muito antes do Cartaxo estava absorvido, passando o grupo a ter oito elementos também com a integração do Capitão, que conseguira reentrar – motivando significativa surpresa! – depois de recuperar das agruras da inclinação de Vale de Santarém e apesar (!!!) do forte andamento que o grupo cimeiro manteve - facto que lançou algumas dúvidas sobre eventuais ajudas externas e... menos correctas! Suspeitas que, no entanto, ficam por provar!
Os quilómetros eram devorados a velocidade vertiginosa. Em breve, estávamos a entrar no Cartaxo. Aí, fiz mais uma mudança forte de andamento. À saída, outra, sempre com os restantes a corresponderem a preceito, mas sempre na roda e sem dar continuidade. A excepção sucedeu neste preciso local, e veio do referido homem da Trek azul. Teve uma demonstração de nível e coragem, passando para a frente com o «comboio» a toda a velocidade.
E não se ficou por aí, repetindo a acção no topo do cruzamento de Aveiras, à chegada a Azambuja, então chamando a si a condução do grupo com ímpeto. Em que eu fiz questão de colaborar, já no segundo topo, mais suave, com nova movimentação (agora com todo o ferro... metido), lançando o grupo – ou o que já parecia restar dele – a 50 km/h em direcção à entrada da localidade. Nessa altura houve-se um grito lá detrás e rapidamente se aliviam os crenques! O Freitas dizia que estava furado. Falso alarme! Por isso, tudo reagrupado novamente.
Até ao Carregado, meteu-se uma velocidade de cruzeiro confortável (a espaços até demasiado), pelo que, a média de 36 km/h registada desde Santarém, pecava por escassa... Nas bombas esperou-se mais de 10 minutos pelo segundo grupo e nada. Decidiu-se continuar... devagarinho. Assim foi até ao sprint de Vila Franca, comparando com a velocidade anterior. Aí, o Freitas fez valer as suas qualidades, mesmo assim superando o Rui Scott muito à justa.
O duelo repetiu-se na rotunda do Cabo de Vialonga, após a subida da cervejeira, depois de eu ter voltado a forçar o andamento até ao alto. De qualquer modo, só a partir deste momento estes dois (mais o Scott) pareciam ter quebrado as amarras da moderação, não deixando cair o ritmo após a sprint, o que levou, desde logo, a estilhaçar definitivamente o grupo e deixando, na frente, apenas quarteto (Scott, Freitas, eu e o Salvador).
O Capitão seguia já distanciado, tentando ainda recuperar – supostamente à custa de mais ajudas «ilegais» agora denunciadas pelo Evaristo que o seguia um pouco mais atrás (indignado, e com razão!). Mais atrasado ainda, e já em nítida «descompressão», vinha o Runa. Perante este empolgante cenário, tive de abandonar a liça e regressar a Alverca (horário «oblige»!...), ficando de fora do que poderia ter sido um «grand finale» em Loures! Por esse motivo, lavro aqui o meu lamento e as também as desculpas aos presentes pela desfeita. Fantástica jornada de ciclismo!

segunda-feira, março 10, 2008

Gradil e o regresso às subidas

Comparado com a longa planura da Clássica de Évora, ainda bem presente na memória colectiva, o percurso de 80 km do Gradil pareceu de alta montanha em versão compacta. Tratou-se, enfim, do regresso ao terreno acidentado e às subidas, tão aguardado por trepadores e outros tais, impondo as primeiras dificuldades aos puros roladores.
A subida para o Forte de Alqueidão, pela sua suavidade, não costuma vincar grandes diferenças, mas quando a nortada é forte, como neste domingo, a boa condição física e também o peso dos músculos assumem especial preponderância sobre os mais debilitados. Foram esses argumentos que o quarteto que se manteve compacto até ao sprint final utilizou para fazer face ao vento contrário sem penalizar o andamento, que nunca foi baixo desde a Bemposta. As despesas maiores fi-las eu, a espaços ajudado pelo Nuno Garcia, que acelerou muito bem nos últimos metros, ainda que contando com a resposta eficaz do Salvador.
Logo atrás, cheguei eu e o Freitas, este a permanecer no abrigo durante toda a subida mas a abdicar da sua maior arma nestas ocasiões: o sprint. Seguiram-se o Polícia – de regresso às lides domingueiras depois do reaparecimento em Évora após longa ausência –, o Zé Morais e o Filipe. Surpreendentemente, só muito mais tarde surgiu o Capitão com o pequeno-almoço às voltas, pouco adiantado ao Grande Abel, em aconselhável gestão de esforço.
Depois de descer para o Sobral e daí para a Feliteira, sempre com precaução devido ao piso ainda molhado das borrascas matinais, já a caminho de Pêro Negro o Freitas saiu da sombra e decidiu meter andamento à seria. Primeiro progressivamente, ganhando alguns metros ao grupo – entretanto «fechados» pelo Garcia – e depois, com bastante mais peso nos crenques, a levar o velocímetro a oscilar entre 35 e 40 km/h até Pêro Negro. Neste caso, foi demonstração de boa forma. Para mim, em particular, ainda com o «ácido» do Alqueidão nas pernas, nalgumas partes cheguei sentir algum...desconforto.
Em Pêro Negro, descansou-se por instantes, disso se aproveitando o Capitão para iniciar a fuga do dia, à qual se juntou o Salvador, ainda antes de Enxara dos Cavaleiros. Cedo se verificou que a aventura era para durar. O pelotão manteve-se na expectativa, mas preferi não relaxar... demasiado. Daí o mérito dos fugitivos na conquista árdua de vantagem, que não demorou a passar de 30 segundos para cerca de 1 minuto já depois da Tourinha – distância com que entraram na dupla ascensão do Gradil (2+3 km). Ainda assim, desde logo pelos meus cálculos, curta para vingar até ao alto da Murgueira. Para mais, enquanto o trio perseguidor iniciava a verdadeira «caçada», liderado pelo Freitas (eu e o Nuno Garcia presentes), na frente a dupla cedo se desfazia, com o Capitão a não aguentar o ritmo do seu companheiro.
No últimos 500 metros da primeira subida, quando substitui o Freitas no comando da perseguição, o Capitão já estava à vista. E após a rápida descida e ainda antes da subida final, viu o trio passar... directo. O Salvador não seguia muito adiante (cerca de 200 metros) mas resistiu estoicamente até ao gancho, à entrada do segundo km da subida, também não resistindo ao andamento do trio, que só se desfez na parte final, primeiro quando acelerei, e depois, na última recta, quando o Freitas sprintou, sem oposição.
Apesar de não ter conseguido o seu objectivo, o Salvador merece elogio pelo esforço desenvolvido em solitário e a óptima subida, mesmo depois de ser ultrapassado, chegando ao Prémio de Montanha da Murgueira pouco depois do Nuno. Ao invés, o Capitão vinha a fazer cócegas aos pedais subida acima, muito diferente do Polícia e do Zé Morais, cujo ritmo de pedalada era sinónimo de (algum) à-vontade.
Os momentos de intensidade não pararam por aí. Como é habitual, a «picante» rampa para a rotunda da Abrunheira e a aproximação à Malveira provocaram forte ardor. Aproveitei-os para continuar a impor ritmo forte, mesmo começando a sentir o acumular da fadiga, numa altura em que já contabilizava mais de 100 km – num total de 142 km ou 5h15.
Nem por isso, o meu regresso a casa foi descansado. Na companhia do «fresquinho» Carlos do Barro, que se juntou ao grupo já na Malveira, com apenas 1h00 de selim, tive de puxar (e bem!) por mim nas subidas para não lhe perder a roda, e não o evitando nas partes finais de Lousa a alto de Montachique, e mais tarde, do Cabeço da Rosa. Apesar da diferença abismal de energia dispendida por ambos naquela altura, devo destacar as boas indicações que deixou, principalmente, muito bom ritmo de pedalada em subida – não fosse ele um assumido trepador!
No grupo que seguiu para Loures, não faltou ainda a tradicional escaramuça do topo de Guerreiros (de Ponte de Lousa).

Nota: no próximo domingo, dia 16, realiza-se a Clássica de Santarém, com mais de 150 km, e cujo percurso é inverso ao habitual: a ida será pelo Porto Alto e Benavente; e o regresso pelo Cartaxo e Azambuja. No decurso desta semana serão fornecidas outras informações sobre a tirada, que promete ser interessante e um óptimo teste de longa distância, quiçá a pensar em Fátima (que este ano também terá percurso inédito, mais longo e exigente). Entretanto, fica desde já estabelecida a hora de partida das bombas da BP, em Loures: 8h00.

terça-feira, março 04, 2008

Clássica de Évora: a crónica

A Clássica de Évora 2008 foi a mais concorrida edição de sempre desta jornada alentejana, demonstrando a crescente projecção e competente organização do evento, que no último domingo reuniu mais de quatro dezenas de participantes ao longo de um percurso de 138 km praticamente plano, entre Loures e a cidade do Templo de Diana.
Se de uma verdadeira competição se tratasse, o início da «notícia» seria mais ou menos o seguinte: «O ciclista do Clube de Grândola, João Santos, em representação da Pina Bike, venceu a edição de 2008 da Clássica de Évora, com ligeiro avanço sobre o pelotão após ter desferido um ataque decisivo a cerca de 12 km da meta e ter resistido à perseguição que lhe foi movida pelo grupo principal, liderada pela equipa de Negrais».
Na verdade, como se previa, considerando o aumento do número e do nível dos participantes, a tirada deste ano foi bastante táctica e assim a menos selectiva das últimas edições, embora estabelecendo média recorde de 33 km/h. Deste modo, não surpreendeu que, à chegada a Évora, o grupo principal fosse mais numeroso que noutros anos, contando com mais de 20 unidades.
Recorde-se que, nos últimos dois anos, apesar de a vantagem final se ter decidido ao sprint, foi sempre um lote muito restrito de ciclistas – não mais de três – a disputá-lo. Todavia, no domingo, uma fuga individual resultou até ao final, com mérito acrescido do seu autor pelo nível superior do pelotão de 2008. O Jony, neste caso, acabou por recolher os louros da sua iniciativa certeira e de inegável categoria, beneficiando do jogo táctico que se estabeleceu entre as duas pseudo-formações do Pina Bike e de Negrais. O ataque que desferiu no derradeiro topo selectivo do percurso, a 12 km da chegada, permitiu-lhe ganhar rapidamente algumas centenas de metros, perante a demorada passividade do grupo principal, tardio a reagir, resistindo estoicamente à perseguição quando finalmente lhe foi movida pelos homens de Negrais – e só por eles. Sobre a meta, instalada como habitualmente, em frente ao hipermercado Feira Nova (primeiros semáforos), a sua vantagem foi tangencial sobre dois «companheiros de equipa», Freitas e eu, que se adiantaram ligeiramente ao pelotão na aceleração final, aproveitando o desgaste dos demais.
Nos primeiros dois terços da prova, o ritmo foi de «cruzeiro», praticamente sem oscilações que obrigassem a maior empenho dos participantes ou passíveis de causar cortes madrugadores no grande grupo. De qualquer modo, este não rolou sempre tranquilo e compacto. Ainda bem cedo, à saída de Alverca, o Jony adiantou-se e por lá andou durante 4 ou 5 km até se deixar absorver antes de Vila Franca, onde a rudeza do empedrado provocou o primeiro momento de grande intensidade. O Capitão já tinha prometido e deu o mote, mas foi o Freitas a derreter o «pavé» a mais de 35 km/h, causando a primeira ruptura no pelotão, surpreendendo inclusive os homens de Negrais. Contudo, era demasiado cedo para que a iniciativa fosse eficaz. Pouco depois da ponte Carmona, o grupo voltou à primeira forma e assim se manteve durante longos quilómetros – até cerca de 15 km antes do muito aguardado «ponto quente» de Montemor.
Então, começaram as movimentações dos principais «trutas». O primeiro a mexer-se foi o Jony, aproveitando uma ligeira inclinação do terreno, mas apenas acelerando a frente do pelotão, insuficiente para desmobilizá-lo. Mais forte, mas também pouco relevante, foi a minha iniciativa, pouco tempo depois, embora permitindo adiantar-me alguns metros ao grosso da coluna, e com o Salvador na roda. O pelotão reagiu e anulou.
Até que, a cerca de 10 km de Montemor, decidi atacar! Novamente, com o Salvador a responder. Rolámos bem durante algum tempo em terreno acidentado (é assim a aproximação a Montemor), mas nunca ganhámos mais de 200-300 metros a um pelotão que não demorou a passar à contra-ofensiva, controlando à distância, e com os de Negrais no comando da perseguição. Entre nós, na frente, rapidamente se percebeu que o Salvador não era colaborador ideal num esforço que tinha de ser intenso para fazer a fuga durar, pelo menos, até passar a subida de Montemor. Nas primeiras rampas, o meu companheiro perdeu o contacto e não demorou a ser absorvido pelo pelotão agora liderado pelo trepador de serviço de Negrais. Durante a subida, já cansado, limitei-me a gerir sem entrar no «vermelho», com a percepção que o pelotão (ou quem o liderava) estava decidido a anular a distância antes do final da subida. Assim, com a fuga já condenada ao malogro, o seu final precipitou-se devido a um corte de estrada, na parte final da subida, devido a uma prova de atletismo, obrigando a um desvio a velocidade moderada.
Este incidente teve duas consequências: tornou a minha reabsorção mais tranquila (bom para mim) e permitiu a quem eventualmente estaria a passar por dificuldades na subida reintegrar-se mais facilmente e a ter tempo de recuperar forças. Deste modo, à saída de Montemor, o pelotão estava de novo compacto e aparentemente... de boa saúde.
A menos de 30 km de Évora aumentavam as reservas e as desconfianças. Os de Negrais pensaram que tinham a situação controlada – nem que fosse à força das palavras! – e os Pina Bike começavam a contar cartuchos.
Na aproximação ao último topo mais longo, já recuperado do esforço da fuga, voltei a acelerar, mas o pelotão não estava para facilidades e respondeu rapidamente. No entanto, o meu empertigamento teve o condão de descontrolar a cabeça do grupo, onde os homens de Negrais demonstravam alguma dificuldade em assegurar a estabilidade, perante a ameaça de uma segunda vaga de Pina Bike de elementos fortes que ainda não se tinham mostrado, nomeadamente o Freitas e o Jony.
Então, aproveitando essa indefinição na liderança do grupo – e algum nervosismo indisfarçável –, o Jony desfere o ataque decisivo, a cerca de 12 km do final, sensivelmente a meio do derradeiro topo. A sua saída foi forte, progressiva e beneficiou da total inércia do pelotão encabeçado pelos Negrais, a quem foi confiada (ou melhor, entregue!) a responsabilidade de perseguir, demorando cerca de 2 a 3 km a reagir – e quando o fez, foi paulatinamente, só iniciando a verdadeira perseguição a cerca de 5 km de Évora. Demasiado tarde. Nessa altura, a vantagem do fugitivo era superior a 400 metros e mesmo se à entrada para o último quilómetro, devido ao cansaço deste e ao «forcing» dos seus perseguidores, a distância se esfumou num ápice, deixando sérias dúvidas sobre se seria suficiente, a verdade é que foi! Por escassos metros, mas suficiente! Cerca de 2 a 3 segundos para o pelotão de onde se tinham destacado ligeiramente o Freitas e eu, na aceleração final, ambos praticamente na roda do grande herói desta especialmente competitiva Clássica de Évora 2008.

Notas de observador

1- Provou-se que quando mais elevado for o nível dos participantes, num percurso quase sempre plano, sem grandes dificuldades de relevo que possam ser selectivas, e para mais havendo um inédito jogo táctico que foi aumentando de intensidade ao longo da tirada, menos probabilidades existem de alguém conseguir chegar ao final destacado. O Jony conseguiu, e por isso está de parabéns. O que lhe valeu foi, como já referi na crónica, a sua invulgar capacidade de explosão, dotes de bom rolador e a felicidade de ter atacado na altura mais propícia. Nem um metro antes ou adiante: precisamente na altura e no local que se revelaram como certos! Além disso, ainda resultante desse jogo táctico, contou com a passividade dos homens de Negrais, a quem foi confiada, em exclusivo, a missão de perseguir, tardia e com organização que deixou muito a desejar.

2- Entre os Pina Bike havia reinava um misto de satisfação pelo dever cumprido, quer por concretização de objectivos colectivos quer individuais, mas também de alguma resignação. Frustração, no meu caso assumida, por ter falhado o «timing» da cartada mais forte, embora reconhecendo que dificilmente mais tarde seria melhor sucedida. Mas a consolação por ter sido agressivo, como gosto, e ter contribuído para se «fazer» ciclismo, como costumo dizer, e também pelas boas sensações que tive após o esforço intenso da fuga, ao ponto de estar apto a continuar a mexer na última fase da tirada. Inclusive no sprint final, onde não sou, de todo, especialista.
Alguma resignação entre outros dos «nossos», casos do Capitão, do Salvador ou do Freitas, os dois últimos limitados na sua capacidade após uma semana de enfermidade. Ao Salvador, porém, o mérito da combatividade, uma marca pessoal a que mesmo debilitado não renega, tendo participado com galhardia na fuga encetada comigo, na qual não colaborando mais por compreensível falta de energia. Ao Freitas, pelos menos motivos de saúde, embora este tivesse estado sempre muito mais reservado ao longo de toda a tirada, sempre no conforto do seio do pelotão, de onde só saiu na parte final, disso beneficiando no sprint à chegada, onde faz valer qualidades firmadas.
Não esquecendo o Capitão, que apesar de, como referiu no final, ter «anulado» os 3 minutos de desvantagem com que tinha chegado a Évora em 2007, exibia semblante de quem tinha deixado alguns «objectivos» pessoais por alcançar. Nem que fosse simplesmente, ter preferido que a prova tivesse sido muito mais aberta e disputada – opinião que partilho – mesmo que lhe custasse muito... sangue.
Por fim, demonstrando bons momentos de forma, tanto o Evaristo como o Pina terminaram sem problemas no pelotão principal, com o primeiro a juntar o mérito de ter sido um dos mais inconformados do grupo, procurando sempre as posições cimeiras do pelotão e participando amiúde na sua condução na fase intermédia da tirada – facto que foi reconhecido e elogiado por quem não conhecia as suas capacidades e bravura. Neste ponto, o homem da bicicleta com extensores de contra-relógio tem motivos para estar mais satisfeito que a maioria.

3- Menos positivo foi o facto de nem sempre ter sido cordial a companhia (embora sempre muito bem-vinda) dos nossos convivas de Negrais. Reparo apenas à falta de desportivismo de um elemento, que não belisca, em nada, o espírito de camaradagem e qualidade atlética dos restantes, reiterando-se, desde já, o prazer de contar com sua presença, não só na próxima Clássica de Fátima como em qualquer evento organizado pelo Pina Bike.
Lamenta-se, porém, que alguém que participa assiduamente em provas de ciclismo oficiais, logo habituado a grandes andanças competitivas, profira expressões de mau tom, em momentos cruciais da tirada, que deixaram algum amargo de boca a quem foram dirigidas. Depois de o próprio, em causa, ter conduzido uma perseguição a alta intensidade, a mais 30 km/h, em subida, a companheiros de esforço que se debatiam, com igual ou ainda maior bravura, num esforço isolado que lhes tinha custado tanta dor e suor, dirigindo-se a estes com termos do género – «então companheiro, morreste na praia?!» ou mais tarde, noutra ocasião, «só és capaz disso?» – é no mínimo indelicado. Desportivismo é algo que se aprende.

4- O enorme êxito da edição deste ano da Clássica de Évora quer-se rentabilizado não só para a prova de 2009, mas também nas muitas que ainda faltam realizar em 2008, com maior destaque para a Clássica de Fátima, no dia 13 de Abril. Este ano, é disputada num percurso inédito, um pouco mais longo, em direcção a Malveira, Torres, Caldas e Alcobaça mas com o final tradicional, a partir da Batalha. Antes, porém, já no dia 16 de Março, atenções viradas para o Loures-Santarém-Loures, a fechar a época das tiradas planas, com mais de 150 km e trajecto inverso ao tradicional, com ida pelo Porto Alto, Benavente, Salvaterra e Almeirim; e regresso por Cartaxo e Azambuja. Este evento constitui mais um interessante desafio à capacidade física dos participantes, merecendo, na minha opinião, o mesmo nível de participação e empenho das grandes clássicas. No rescaldo de Évora, em percurso muito similar em termos de relevo e quiçá, no cômputo geral, mais difícil, constituirá ocasião ideal para quem quiser proceder a... rectificações.