terça-feira, setembro 21, 2010

Crónica de Montejunto

Montejunto é sempre assim: ansiedade no início, sofrimento durante e êxtase no final. Foi certamente assim que se sentiram os que, no domingo, atingiram o cume da serra de 660 metros, a Varanda do Oeste. A ascensão por Pragança, a vertente mais curta, mas a mais constante e, por isso, a que tem a inclinação média mais elevada: 7,5% (exceptuando a do terrível Avenal) faz-se após aproximação em falso plano ascendente, a preparar o choque que é entrada naquela localidade, o duro início da subida, que lança os 5,5 km seguintes em que são escassos os momentos de descanso.
Este foi o ponto mais alto (literalmente!) da volta deste fim-de-semana, que teve noutros de inegável relevância também a contribuição para uma enorme jornada de ciclismo. Desde logo, o numeroso pelotão, nivelado por cima e pejado de figuras. A prova dessa elevada bitola foi a subida para o Forte de Alqueidão, com andamento de excepção desde a Bemposta para tempo abaixo dos 23 minutos: o meu «personal best». Corrijo, o melhor em que estive presente, pois a minha participação foi... nula! A proeza tem autor: o Renato Hernandez, que, embora a espaços coadjuvado, pautou sempre o andamento. E todos sabem como é difícil – até na roda – fazer os mais de 11 km sempre no prego. O Rui Torpes, que foi um dos poucos que se assomou à ilharga do Renato, reconheceu que a diferença de estar à frente e no conforto do pelotão era de 20 pulsações. Bom, por isso é que, apesar do ritmo elevado, passei mais ou menos incólume, com a pulsação abaixo do limiar anaeróbio (média de 162). Grande diferença em relação à semana transacta (eis os benefícios de se fazer qualquer coisa durante a semana). Além disso, a demonstrar o nível médio elevado do grupo, o facto de este se apresentar compacto à chegada ao Alqueidão.
Tempo no alto: 22m53s, menos 33 segundos que o anterior melhor e nova marca a bater.
A descida do Sobral para a Merceana foi tranquila, apenas polvilhada de algumas acelerações do Jony, que, quando lhe apetecia, destacava-se perante estranha permissividade do grande grupo. Ou seja, depois do Alqueidão, quem se daria ao trabalho de substituir o Hernandez nessa tarefa? Como ele não reagiu, relaxou até, todos aceitaram a sua atitude, como se de um «chefe» se tratasse.
Todavia, do Jony, naquela altura, eram apenas ameaças. Porque depois de se acumular mais desgastes no Freixial do Meio e na Atalaia, na descida de Vila Verde dos Francos para o Vilar, aproveitou um adiantamento do Freitas para atacar, agora... a sério. No pelotão, no mesmo tipo de terreno, a mesma estranha parcimónia. E provavelmente o mesmo pensamento anterior: «se o Renato não se mexe...». O grupo ainda avistou a junção do duo à passagem pelo Vilar, mas num ápice esfumou-se.
Até à subida de Martim Joanes foi em ritmo de passeio, interrompido, aí, por surpreendente iniciativa do Carlos Cunha, que levou o grupo a alcançar «um» duo, mas não o original: o Xico Aniceto substituía o Jony, que partira em solitário.
No momento da junção, outro imprevisto: o pelotão «encostou» e manteve-se na roda do duo. Estranho! Estaria a confundir o Xico com o Jony? Improvável! Ninguém queria assumir a perseguição, com Montejunto ali tão perto. E foi no ritmo calmo, pausado, que estes levavam que se cumpriu a ligação a Pragança, desde logo com a convicção que alcançar o fugitivo seria missão mais que improvável.
Entrada em Pragança e a estrada apontada ao céu. O Freitas movimentou-se mas logo abdicou. Passou a localidade e o ligeiro descanso, para logo voltar a empinar. O grupo da frente continha-se, e a primeira aceleração veio do... improvável Pedro. As respostas de alguns, embora progressivas, quebraram a unidade, destacando um quarteto: Pedro, Luís (TNT), Torpes e André. Vinte metros atrás: eu, Renato e Carlos Cunha. Mais atrás, o Carlos Gomes e o Mário.
Abordagem à famosa rampa dos 15% e mais uma surpresa! O Jony logo ali à frente, em ritmo de... paragem. E parou mesmo. Entretanto, na frente o Luís e o Pedro descaiam e eram absorvidos por nós. O nosso grupo, agora quinteto, o Renato passa mal nos metros finais do primeiro segmento da rampa, antes do pequeno descanso, para o segundo, mais curto. E tal como o Pedro e definitivamente o Luís, perdem alguns metros para mim e para o Cunha – e juntos enfrentamos a ligação ao quartel e à fase final da subida. Nesta, o Cunha ganha alento e eu, para não perder a sua roda, «passei ao lado» do recomendável descanso. Quando o terreno se elevou novamente (estávamos aos mesmos 20 metros do Torpes e do André) senti as pernas a vacilarem, a hipotecar o resto da subida. Esvaziava-se o gás para uma eventual aceleração final, restava-me ligar o «cruise control».
Em consequência, tive de largar o Cunha e fui engodo aos perseguidores. Traiçoeiro, no caso do Pedro, que se esforçou demasiado para chegar à minha roda e cedeu abruptamente. Mas encorajador para o Renato, que vinha em crescendo. Tinha-o já na minha roda à entrada dos 300 metros finais, enquanto alcançava o Cunha (agora em nítida perda) e não demorou muito a retemperar forças – também porque se fazia tarde. Ultrapassou-me, levando-me a procurar a sua roda, que segurei apenas por instantes. Nos derradeiros 100 metros, limitei-me a não perder muito e aproveitar o estímulo que foi mais uma das suas demonstrações de força.
O meu tempo foi de 21m48s (médias de 15,5 km/h e 182 de pulso). Já fiz mais depressa (menos 42 s) na mesma volta em Agosto de 2008, numa subida em que persegui, à morte, o indomável Hélder Calado até ao quartel. Foram 4 km que não se esquecem! Quando o alcancei, olhou-me e disse: «não fazia sentido ires aí atrás a sofrer...». Nesse momento, a montanha fez-se azul, de muito sofrimento e, vá lá, um niquinho de... RAIVA! Até ao alto, só se não pudesse. E não pude... Logo nessa altura tinha o mundo de mostrar como é ingrato!!
Resta dizer que, na frente, o duo Torpes/André (pareceu) que não se desfez, apesar de várias tentativas do primeiro. E que quase todos os participantes alcançaram, triunfalmente, o cume da serra.No longo regresso a Loures, os protagonistas mudaram: ainda que o Jony continuasse a mostrar serviço no seu terreno predilecto, surgiram o Carlos Gomes, o Alexandre e outros a encabeçar o pelotão a grande velocidade, culminando no tradicional sprint de Vila Franca, disputado metro a metro pelo Cunha e o Jony. Finalmente, na subida da cervejeira, juntei-me ao Torpes e isolámo-nos até Vialonga, após o camarada Alex me ter levado em bandeja de ouro.

3 comentários:

Anónimo disse...

olá ricardo foi um prazer fazer esta volta,pessoalmente fiz 167km o que foi um record no meu caso(amadora-montejunto-amadora) e continuar a sentir um crescimento de forma e ter acabado bem e com energia pese embora ter errado ao atacar muito cedo no montejunto para as minhas caracteristicas,mas como não sou profissional a ilusão de se conseguir chegar mais a frente cega me por vezes lol nada que o acabar de forças abruptamente não me faça descer á terra lool gostei ainda da subida ao forte de alqueidão , que ritmo!! parabéns ao renato a dar a cara quase em todo o lado. um abraço para todos e até para a semana
pedro

Pedro Fernandes disse...

Claro!..

Mais um passeio extremamente agradável. Pena é não efectuarmos mais passagens pelo alto do Montejunto durante o ano.
Quanto à observação do Ricardo em determinado trajecto "(...)ritmo calmo e pausado(...)" detém um sentido de humor deveras elevado, ehhh.Bem só pode ser observação de "pro", upsss.

Até Domingo
Pedro Fernandes

Anónimo disse...

Grande Crónica como sempre Ricardo.
Obrigado por teres este trabalho todas as semanas :)

Este domingo fiz duas coisas mal. Com as pressas de sair de casa a tempo, para não vos perder outra vez, não tomei o pequeno almoço e não levei o meu redbull do minipreço :P
O contra relógio de 20 km do costume é um dado adquirido e ainda por cima armei-me em herói e fui para a frente puxar pelo Renato na primeira subida e senti literalmente as forças a esvaírem-se. Numa subida antes de Pragana já tinha ficado para trás e assim que entrei em Montejunto (e já não tinha líquidos ou comida) o panorama já era mau...
Aquela subida foi ainda mais difícil porque (só descobri na nacional10) tinha o pneu da frente com muio pouca pressão. Aquilo já é larguito e assim ainda trava mais, especialmente a pedalar de pé. bati-me com o Carlos Gomes e mais ninguém. Quando cheguei ao topo fui mesmo até ao fim da estrada e ao voltar para trás dei-me conta que vocês todos já tinham saído em direcção á Abrigada. Fui atrás do João mas ele ia endiabrado. Cheguei a atingir os 80km/h e ele ia ainda mais depressa. Não vos consegui apanhar por pouco e quando cheguei à Abrigada estava empenado. Saí da bicicleta a tremer e fui atacar os pacotes de açúcar da senhora do café!
O meu Muito mas mesmo Muito obrigado ao João (Jony) pelo Gel da CarbBooom que ele me deu e ao Alex pelo pedaço de chocolate! Salvaram-me a vida!
Bem...
Isto tudo para confirmar que o meu segredo são de facto os Corn Flakes!