Os «Muros» confirmaram,
uma vez mais, o «caráter» que os tornam tão especiais. Posso seguramente afirmar
que a edição deste ano foi a de mais alto nível de toda a (já longa) existência
desta volta, que é um desafio à capacidade de superação física e anímica dos
seus participantes, dos menos aos mais... preparados. Digo-o, com a ressalva
de, no ano passado, não ter integrado o autêntico grupo de elite que esteve
presente – Renato Hernandez, Rui Torpes, André, Hugo Arraiolos – mas num trio que,
todavia, manteve aqueles sempre à vista até à subida de Galegos/Molhados – eu,
o Jorge «Contador» e o Félix «Cancellara».
No último
domingo, porém, o grupo era mais numeroso e tão empenhado, e o nível até um bom
degrau acima. Os números confirmam-no: tempos mais rápidos em quase todas as 13
subidas, para um total de 8 minutos retirados em relação a 2013: 3h21 contra
3h28. Anunciemos, então, os 10 bravos do pelotão que atacaram a Serra da
Alrota, o primeiro «muro» do percurso: Nuno Mendes, Felizardo, Jorge, Luís
Veloso, André, Augusto Vitorino, Jony, Tiago Martins, Duarte Azenha e eu.
Todavia, não foram só estes que se fizeram ao Roteiro, mais de uma dezenas de
abnegados venceram-no igualmente, cada elemento/grupo ao seu ritmo próprio, e
no final, certamente, com o mesmo sentimento de dever cumprido – o de uma manhã
de ciclismo em cheio.
Mas passemos
ao relato dos principais acontecimentos: desde logo, a íngreme Alrota, com o
seu quilómetro a 8,5% médios. Curva apertada à direita, contracurva, acima de
10%, e madrugadora movimentação! O Mendes mete «uma abaixo» e arranca como se
não houvesse... mais «muros»! No pelotão, o único a reagir foi o Augusto, alcançando-o
rapidamente. Os dois não tiveram mais de 50 metros de vantagem, e o Mendes cedo
decidiu abdicar. Sensato. Se quisesse durar... Este golpe teve o condão de aumentar
o andamento do grupo e, consequentemente, a seletividade daquela ascensão. Por
isso, no alto houve diferenças, embora pequenas. Nada que a descida para
Bucelas não dissipasse.
Na parte
final, contratempo: o Mendes perde o bidão. Meia-volta. Eu e o Felizardo
aliviámos, aguardando. Logo a seguir também o Tiago. Ainda antes do final da
descida, salta novamente o bidão demasiado XL para a grade. Mais atraso. Os da
frente não se aperceberam. Por isso, a dúvida do Félix não poderia ter resposta
dos seus companheiros: «Será que eles esperam?» No Roteiro, esta é uma pretensão...
secundária.
Os quatro
fizemo-nos à subida de Bucelas para as antenas, mais 1 km (6%), acelerando
paulatinamente e mantendo passo rijo em direção a Santiago dos Velhos (SdV).
Pelo caminho alcançamos o Luís Veloso e o Jorge, que teriam refreado o ímpeto
pela nossa falta. De qualquer modo, à entrada da 3.ª subida (SdV), observámos
que o grupo adiantado aguardava. Excelente! Antes bem antes do topo, pelotão
compacto.
Na ligação à
Contradinha, finalmente pude começar a cumprir uma parte do plano para o
treino/volta: fazer transições sem descanso completo. Assim, passei para a
frente, repetindo a iniciativa quase invariavelmente em todas as subidas que
restavam. A rampa da Contradinha, que «abri» antes de o Augusto ter tomado a
dianteira na segunda metade, voltou a espaçar o grupo, com os primeiros sinais
de dificuldades de alguns. Em contraponto, a esmagadora maioria evidenciava coesão
e um nível muito similar. Pelo menos, até aí...
Longa
descida pela Louriceira até Ponte de Monfalim e o primeiro grande pitéu da
jornada: a subida de S. Quintino. O Duarte disse que a desconhecia, admitindo
que «sempre que podia passava-lhe ao lado» para não a enfrentar. Pelo menos,
sabia da fama. E certamente não terá ficado defraudado. Mais do que isso:
lançou-se a ela e venceu-a, atingindo o topo a poucos metros do trio que se
destacou: Augusto, Jorge e eu. Aqui, como é hábito, os primeiros amassos
sérios. A prová-lo, só na paragem «fisiológica» na Seramena se reuniu de novo o
pelotão. Mas uma primeira baixa: o Félix demorou, demorou e nem após a pausa e
um período de contenção na descida para Casais de S. Quintino chegou para que
se reintegrasse. Este ano, os Muros estiveram mais altos do que em 2013!
Definitivamente, demasiado.
Casais de S.
Quintino voltou a fazer-se «ligeirinho», com o Augusto e o Tiago em evidência,
mas a partir do cume foi o Jorge, o Duarte e principalmente o Jony, vindos de trás,
a relançar o andamento. Num ápice estávamos em Sapataria, com Galegos/Molhados
pela frente. Nada de novo, nem sequer o andamento – que continuou vivo. À saída
da subida, o habitual «forcing» do Augusto, que abordou da mesma maneira todas
as subidas, acelerando progressivamente; tal como eu, mas a abri-las e nas já
referidas transições.
Fi-lo também
nesta, até à Póvoa da Galega, e a entrar para o «muro» da Charneca. Transposto!
Agora com o Jony e o Duarte um pouco mais descaídos, a fazerem contas às que
(lhes) restavam. Mais duas: a inevitável Choutaria e Rogel.
Na longa
descida, mais do mesmo: eu a imprimir o ritmo, o que suscitou a pergunta do
Tiago depois de Ponte de Lousa: «a que pulsações desceste?». «Em redor das 150»,
respondi. Eis o custo (voluntário) deste «exercício» que, creio, também acrescenta
uma dose de dificuldade... à dificuldade do Roteiro.
Enfim, a
Choutaria. À entrada, muitas dúvidas. Havia quem desconhecesse a subida. Terrível!,
com aquele famoso «muro» final acima de 20%. Um desses desconhecedores era o
Tiago – e pagou por isso. Mas não por incapacidade, sim por desmedida
confiança. A violenta aceleração que fez à entrada para a parte mais íngreme da
subida, para responder à que o Augusto conscientemente efetuou, custou-lhe um
dissabor de todo imprevisto. Sofreu o que os espanhóis chamam «parón» e nós
«ficar a pé», mas pior: teve a necessidade de meter o pé no chão. Faz parte do
ciclismo. Nada de mais, e perfeitamente justificável pelo excesso que cometido.
No alto, o Augusto (também ele teve de moderar bastante o ímpeto) voltou a
destacar-se, confirmando ser o elemento mais forte do dia. Esperava-se mais do
André, que esteve em notória (e assumida) contenção, a gerir a fadiga de
treinos recentes.
Mas só um
patamarzinho abaixo destes dois jovens esteve o Jorge (o Duarte também enquanto
esteve presente), com o ciclista de Arcena a assomar-se aos lugares cimeiros à
medida que as subidas (e o desnível) se acumulavam. Teremos o melhor Contador
de regresso!? Foi isso que mostrou em Rogel, em Monte Gordo e especialmente nas
exigentes Salemas, onde veio «de trás para a frente», surgindo em grande estilo
na parte final para levar, a mim e ao André, a fechar o espaço para o Augusto.
Ou quase...
Nesta altura, os restantes vacilavam mais a cada ascensão e para a
derradeira, de Ribas de Baixo-Fanhões, apenas o Luís Veloso e o Tiago (enormes na
capacidade de superação e a fazerem jus a méritos de trepadores) restavam entre
o quarteto (Augusto, André, Jorge e eu). No «grand finale», o Augusto, o André
e o Jorge, sem forçarem muito deixaram-me literalmente agarrado às pernas - que
tinham razões para reclamar dos maus tratos do dia. O treino e, acima de tudo,
o divertimento... já cá estavam!
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